Secretria diz que foi ameaada por ministro de Bolsonaro

 

Letícia Dornelles diz que está com a “consciência tranquila” após receber o aviso, nesta quinta-feira (14), de sua exoneração do cargo de presidente da Casa de Rui Barbosa, fundação que ela dirigia desde 2019, por indicação do deputado Marco Feliciano (PL). Jornalista por formação e roteirista de novelas, ela afirma, ao EXTRA, que vinha sofrendo ameaças e assédio moral de Mario Frias, ex-secretário de Cultura. E que a sua demissão é resultado de uma “perseguição”.

A gota d’água para o afastamento de Letícia veio à tona na última semana, conforme noticiou o colunista do GLOBO Lauro Jardim. Na visita técnica a Casa de Rui Barbosa realizada pelos integrantes da equipe da área de Cultura da transição, a diretora da instituição teria entregado ao grupo um documento contra seu ex-superior hierárquico, que chefiou a Secretaria de Cultura de Jair Bolsonaro durante dois anos. Questionada, Letícia nega que tenha elaborado qualquer dossiê.

— Recebi, por dez minutos, a equipe de transição, como manda a lei e a ética — ela conta, ao relembrar o episódio. — Nunca tive embate (com Mario Frias). Recebi ameaças de Mario Frias, veladas, por terceiros. Eu trabalho, e talvez incomode por produzir Cultura. Honrei Rui Barbosa. Defendi a fundação, e impedi que ela fosse fechada. Fui perseguida, ameaçada e assediada.

Procurado pelo GLOBO, Mario Frias ressaltou que não tem interesse em comentar o assunto. Por meio de mensagem, respondeu com “kkkkkk”, para indicar que gargalhava, e afirmou: “Tenho que rir mesmo. Hoje sou apenas um deputado eleito”. Em seguida, pediu a este repórter, “com todo respeito”, como indicou, para “escrever o que quiser”, acusando este veículo por buscar “intriga e mentiras”.

— A narrativa de que eu ameaço alguém foi criada por vocês (da imprensa). Sou um homem muito bem casado há 18 anos. Tenho Deus no coração. E muita paz na minha vida — afirma o ex-secretário de Cultura do governo Bolsonaro.

Gestão turbulenta

Letícia Dornelles manteve, nos últimos três anos, uma gestão turbulenta à frente da Fundação Casa de Rui Barbosa, instituição que abriga importantes arquivos privados de 130 escritores brasileiros, como Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Vinicius de Morais e Manuel Bandeira.

Em janeiro de 2020, recém-empossada, Letícia exonerou Flora Süssekind e outros quatro chefes de pesquisa. À época, o afastamento foi visto pelos funcionários como perseguição política, já que eles haviam se manifestado contra a nomeação da presidente. Intelectuais e frequentadores da Casa de Rui Barbosa chegaram a fazer um protesto em frente à instituição e os servidores divulgaram um abaixo assinado pedindo a saída de Dornelles. Falaram ainda em “aparelhamento” da casa, alegando que a diretora tinha a intenção de “agradar o governo para manter o seu cargo”.

Nesse período, em entrevista ao GLOBO, Letícia Dornelles afirmou que as denúncias e críticas à sua gestão — como acusações por censura, falta de diálogo, cerceamento a funcionários e uso dos canais oficiais para autopromoção — eram frutos de uma perseguição pelo fato de ser evangélica. “Sou conservadora, mas não sou radical em nada”, ponderou, na ocasião.

A experiência de Letícia na área foi questionada pelos pesquisadores desde o dia de sua nomeação. Seu currículo, disponível no site da Casa de Rui Barbosa, tem imprecisões. Nele, a ex-jornalista esportiva e roteirista de novelas — ela foi colaboradora de folhetins como “Por amor” (1997) e “Andando nas nuvens” (1999), além de ter assinado a autoria de tramas como “Metamorphoses” (2004) e “Amigas & rivais” ( 2007) — informa ter sido indicada ao Prêmio Portugal Telecom (atual Oceanos) em 2002, mas a premiação só foi criada em 2003.

— Tenho a consciência tranquila — ela frisa, ao GLOBO, ao discorrer sobre seu trabalho à frente da instituição nos últimos anos. — Protegi servidores de assédio, homofobia e racismo. Levei a Casa de Rui Barbosa à ONU e à Haia.

 

FONTE: Folha Max

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