Reeleito como o deputado estadual mais votado em Cuiabá, e cotado para disputar o Palácio Alencastro em 2024, Lúdio Cabral (PT) afirmou que a atual administração do prefeito Emanuel Pinheiro (MDB) é um exemplo do que o próximo gestor não deve fazer.

O PT está em uma federação que é, metaforicamente, uma espécie de cavalo de Tróia
“O segundo mandato dele é muito precário. Na minha opinião, o principal legado é o aprendizado para aquele que vier depois, do que não se deve fazer. Daquilo que não se deve deixar acontecer”, disse.
Em entrevista ao MidiaNews, o petista não confirmou que disputará o pleito do próximo ano, mas garantiu que o candidato do PT fará oposição à gestão Pinheiro.
No entanto, até chegar no momento da disputa, Lúdio admitiu que o partido precisará resolver uma “equação complicada” em relação à federação, que faz parte junto com o PV e PCdoB.
“O PT está em uma federação que é, metaforicamente, uma espécie de Cavalo de Tróia. Porque no PV tem o Stopa, que é pré-candidato e é apoiado pelo prefeito. Não cabem na federação duas candidaturas, muito menos de oposição do PT, e uma de apoio no PV”, afirmou.
Ao longo da entrevista o deputado também falousobre sobre a situação do sistema de saúde em Mato Grosso e deu sua opinião sobre a atuação do governador Mauro Mendes (União) nos últimos 5 anos.
Confira os principais trechos da entrevista:
MidiaNews – O senhor já havia falado certa vez que pretendia terminar o mandato de deputado estadual. Admite abreviar sua passagem pela Assembleia para disputar a Prefeitura de Cuiabá?
Lúdio Cabral – Nós acabamos de assumir o novo mandato com a responsabilidade multiplicada e o meu foco hoje é realizar um mandato de qualidade. Agora, é lógico que até pelo fato de eu ter sido, em 2018 e em 2022, o candidato a deputado mais votado em Cuiabá, já ter disputado a Prefeitura, quase ter vencido, produz em uma parcela da população essa reinvindicação, para que eu dispute. Tenho consciência dessa responsabilidade, assim como tenho consciência da minha responsabilidade com o mandato.
Me preocupa muito essa precipitação que está acontecendo em Cuiabá no debate eleitoral. O comportamento de alguns partidos, de alguns pré-candidatos é de quem enxerga que a eleição é daqui dois meses, mas será daqui um ano e dois meses.
Então, prefiro me concentrar no exercício do meu mandato e não me deixar, neste momento, me contaminar pela disputa eleitoral. Aguardar o momento certo e em 2024 debater.
É lógico que há uma expectativa de uma parcela da população e as pesquisas que saem demonstram isso, mas está cedo ainda. O PT nacional também quer que a gente faça uma definição até outubro e novembro nas capitais do país, mas prefiro esperar o momento mais adequado.
MidiaNews – Em 2014, quando disputou o cargo de governador, o PT lançou sua candidatura poucos dias antes das convenções e vocês perderam. Não teme que esse adiamento possa prejudicar em 2024, como já aconteceu anteriormente?
Lúdio Cabral – Já há de fato uma movimentação acelerada em torno da disputa de 2024, mas sinceramente, exatamente por já ter disputado duas eleições majoritárias, aprendi com as disputas. Ainda tem muito tempo daqui até a eleição, muita coisa ainda pode acontecer.

A tarefa do Lula, que é enorme, gigantesca, é de governar o país e melhorar a condição de vida da população. Essa será a maior contribuição dele nas disputas eleitorais de 2024
Eu nunca tive vida fácil em disputa de eleição. Nunca tive vida fácil inclusive no próprio PT, para ser candidato a prefeito em 2012 foi uma via crucis que percorri, sempre fui minoria no PT, que por ser um partido democrático é no debate que a gente constrói os processos de decisão.
Mas mesmo em 2012, o início da minha movimentação foi no ano da eleição, não anteriormente. Comecei a campanha com 4% nas pesquisas, terminei o primeiro turno com 42% e no segundo tive 46%.
Em 2014 foi da mesma forma, a decisão aconteceu muito próximo da campanha começar, mesmo assim tive 33% dos votos e o PT nunca havia alcançado um percentual de votos em uma eleição para governador como foi em 2014. Então, mesmo na derrota eleitoral, foi uma vitória política.
Estou vendo gente muito desesperada, como se a eleição fosse acontecer amanhã, mas a eleição é uma maratona, não é uma corrida de 100 metros. O apressado come cru.
MidiaNews – O senhor defende uma candidatura de oposição ao prefeito Emanuel Pinheiro, mas isso pode não acontecer porque o PT nacional está querendo aliança com o MDB nas capitais.
Lúdio Cabral – Essa é uma equação complexa e de difícil solução. O PT em Cuiabá tem um leitura crítica da atual administração municipal. O partido tem posição formal de oposição ao atual prefeito. Com todo respeito ao prefeito como pessoa, as escolhas que ele faz, mas a posição do PT é de oposição a essa forma de governar a cidade devido à consciência que temos de que os problemas estruturais não foram superados.
Por isso nossa posição de que o PT tem o dever de apresentar uma candidatura em 2024, mas uma candidatura de oposição, de mudança da realidade da cidade, porque não tem sentido oposição por oposição. Eu pessoalmente vou me esforçar para que esse seja o posicionamento do PT independente de quem seja o representante na eleição.
MidiaNews – Como o senhor avalia as dois mandatos de Emanuel Pinheiro?
Lúdio Cabral – O Emanuel Pinheiro fez uma gestão razoável no primeiro mandato, a exceção de algumas áreas onde problemas estruturais não foram enfrentados. Porém, o segundo mandato é muito precário.
Na minha opinião, o principal legado é o aprendizado para aquele que vier depois, do que não se deve fazer. Daquilo que não se deve deixar acontecer.
MidiaNews – A Saúde de Cuiabá está sob intervenção desde março. Como médico da rede pública, consegue fazer uma análise de qual foi o grande erro do prefeito Emanuel neste setor?
Lúdio Cabral – Temos um Estado que é continental e é difícil você organizar um sistema de saúde para atender um Estado dessas dimensões e com essa densidade demográfica. E Cuiabá acaba sendo tributária da incapacidade de se organizar o sistema de saúde do Estado.
Quando não há diálogo entre os gestores, cria-se uma situação de praticamente colapso do sistema de saúde. Além disso, a gestão da Saúde de Cuiabá tem problemas seríssimos, falta de medicamentos na atenção primária, falta de profissionais e a intervenção é sintoma desses problemas. Uma parte dos problemas podem e devem ser superados.
Eu sou servidor da Saúde há 27 anos em Cuiabá, atuando na ponta do sistema, atendendo a população. Nós temos problemas que são estruturais na Saúde da Capital, que vem de vários governos que não conseguiram dar conta de superá-los. O principal deles é a precariedade da atenção primária, 80% podem e devem ser controlados lá na comunidade, no local de trabalho, na escola, com ações de prevenção, de promoção da saúde e de cuidado precoce no momento certo.
Nenhum Governo que passou em Cuiabá enxergou isso, deu essa prioridade. A prioridade é sempre apagar incêndio onde os problemas agravados gritam.
MidiaNews – Qual a primeira providência que o próximo prefeito de Cuiabá deverá tomar quando assumir?
Lúdio Cabral – Primeiro precisa ter um compromisso de vida com a cidade, precisa conhecer os problemas de Cuiabá, precisa conviver com a população, ter qualificação técnica e também buscar qualificação técnica. Precisa ter capacidade de escutar os cuiabanos, de diálogo, de mobilização de um esforço coletivo do conjunto de servidores e da população para enfrentar os problemas que a cidade tem.
MidiaNews
Lúdio afirmou que quer focar no mandato como deputado e citou responsabilidade com eleitores
É preciso também ter uma relação de respeito com os outros governos, principalmente o Governo do Estado e Governo Federal, independente da posição política, porque tarefa institucional independe de partido, das posições que você defende.
A campanha eleitoral não pode ser algo que comprometa uma gestão, tem que ser o mais respeitosa possível com a população e tem que conter o peso do poder econômico, que às vezes compromete as gestões.
A disputa política tem que ser civilizada, porque depois quem vencer precisa ter diálogo com os outros setores.
MidiaNews – O presidente Lula terá alguma participação na escolha do candidato a prefeito de Cuiabá?
Lúdio Cabral – A tarefa do Lula, que é enorme, gigantesca, é de governar o país e melhorar a condição de vida da população.
Essa será a maior contribuição dele nas disputas eleitorais de 2024, exercer com qualidade o mandato de presidente da República. Isso que vai contribuir para as eleições do próximo ano.
MidiaNews – O PT está em uma federação com o PV, do vice-prefeito José Roberto Stopa, e o PCdoB. Como fica isso?
Lúdio Cabral – O PT está em uma federação que é, metaforicamente, uma espécie de cavalo de Tróia. Porque no PV tem o Stopa, que é pré-candidato e é apoiado pelo prefeito. Não cabem na federação duas candidaturas, muito menos de oposição do PT e uma de apoio no PV. Essa é uma equação que terá que ser resolvida.
O prefeito de Cuiabá é do MDB, o natural seria ele ter um candidato para defender a gestão dele no partido dele e não na federação. Na minha opinião, a outra razão para o PT se posicionar no campo da mudança é que não podemos deixar o discurso da mudança ser ocupado por quem não representa a mudança de verdade, ou pior, representa a mudança para a pior.
Não podemos viver em Cuiabá um Governo pior, uma situação de desgoverno na cidade com discurso de mudança.

Sai de 22.701 votos para 47.433 votos, uma avaliação muito positiva, mas que ao mesmo tempo amplia a responsabilidade que temos
A federação é um casamento de quatro anos. Hoje em Cuiabá nesse casamento estamos em casas separadas, alguma resposta terá que ser encontrada. E um dos cônjuges, na verdade, tem uma relação com uma outra posição política que não é de dentro da federação.
MidiaNews – O PT nunca conseguiu vencer uma eleição para prefeito da Capital e sempre enfrenta dificuldades para eleger vereadores por Mato Grosso ter certa resistência com a sigla. Acha que em 2024 o cenário será favorável a um nome da esquerda? Não teme ser patrolado pelo pragmatismo do PT?
Lúdio Cabral – A política é muito dinâmica. Nas eleições nacionais nunca tivemos menos que 35% dos votos, já chegamos a vencer as eleições presidenciais em Mato Grosso. Então, o nosso ponto de partida é 1/3 do eleitorado de Mato Grosso.
E em Cuiabá o nosso ponto de partida, na minha opinião, é maior. Já disputamos o segundo turno na Capital em duas eleições, em 2004 e 2012. Na eleição passada, a votação nas nossas chapas proporcionais se multiplicou por dois, tivemos a Rosa Neide como a deputada federal mais votada em Mato Grosso, muito a frente do segundo colocado, porque ela fez quase 125 mil fotos e o segundo fez menos de 100 mil, mas as regras eleitorais não permitiram elegê-la.
O Lula teve quase 700 mil votos e em Cuiabá fui um candidato do PT que fez a maior votação para deputado estadual, na Capital do Estado dito conservador, fazendo campanha baseado em voto livre e consciente, na rua, olhando no rosto das pessoas. Então tem um espaço para o PT.
MidiaNews – É preciso fazer uma autocrítica?
Lúdio Cabral – Tem que ter essa capacidade, porque ninguém é perfeito, temos que reconhecer quando nós erramos.
O Governo do PT em Cuiabá, por exemplo, não será só do partido, vai ser um governo amplo, porque tem boas pessoas em vários campos políticos que podem contribuir para a boa gestão na cidade. A gestão contaminada pela disputa política é que gera relações ruins como essa situação que vivemos em Cuiabá hoje.
Mesmo tendo uma posição política diferente da posição do governador Mauro Mendes, tenho que ter capacidade de dialogar com ele, tenho que ter a humildade de sentar a mesa para pensar o enfrentamento das questões que precisam ser enfrentadas. É o que eu faço como deputado hoje.
MidiaNews – O apoio que o senhor recebeu do ex-governador Silval Barbosa, na candidatura de 2014, trouxe uma série de problemas e críticas, em meio a denúncias de corrupção por parte do ex-gestor. Teme que isso seja usado de alguma forma em uma eventual disputa eleitoral do próximo ano?
Lúdio Cabral – Em 2014 foi uma eleição que se deu em um contexto político em que a Dilma era candidata à reeleição e o candidato à vice era do MDB, o Michel Temer, que dois anos depois foi um dos articuladores do impeachment. Era um contexto político, uma conjuntura política e o PT tinha uma aliança com o MDB. Em política não existe arrependimento, existe aprendizado. Quando temos oportunidade de colher aprendizado, temos que fazer isso e não podemos repetir os mesmos erros.
Então, tudo que construí de aprendizado na minha trajetória política, sendo a primeira eleição que disputei em 2004 como vereador, ou seja, quase 20 anos… Todo esse aprendizado me trouxe até aqui e eu procuro melhorar sempre a partir dos erros e dos acertos.
MidiaNews – O PT e o bolsonarismo têm visões inconciliáveis em quase tudo. Na sua opinião, que é um petista histórico, o que representaria para Cuiabá uma eventual vitória do bolsonarista Abílio Junior, que lidera as pesquisas?

Em política não existe arrependimento, existe aprendizado. Quando temos oportunidade de colher aprendizado, temos que fazer isso e não podemos repetir os mesmos erros
Lúdio Cabral – Não cabe a mim fazer esse tipo de julgamento. É a população quem tem que avaliar o comportamento de todos que exercem mandato público.
O Abílio é deputado federal hoje, representa o Estado de Mato Grosso, eleito legitimamente, então a quem cabe avaliar o comportamento dele na Câmara dos Deputados? A população do Estado, não a mim que tenho outra posição política.
MidiaNews – O governador Mauro Mendes apareceu em recente pesquisa do Instituto Paraná com uma aprovação de 72,6%. Como o senhor avalia a gestão do governador Mauro Mendes?
Lúdio Cabral – O governador foi eleito praticamente por W.O.. Infelizmente, não conseguimos construir um programa para fazer a disputa com a profundidade que ela deveria ter sido feita. Portanto, ele foi reeleito. O governador tem qualidades, ele é um bom gestor privado. Ele tem uma capacidade muito qualificada de montar a equipe sintonizada com o projeto que ele defende.
Agora, na minha opinião, Mato Grosso é governado para atender ao interesse dos muito ricos. Por isso minha postura crítica, porque a educação pública do Estado é muito precária e as medidas que o Governo do Estado tem experimentado tem piorado a qualidade da Educação por mais que ele faça discurso que tem melhorado.
A saúde pública continua precária. O foco na construção de hospitais, que vão levar talvez mais quatro anos para serem concluídos, não solucionam os problemas. A Agricultura Familiar não tem a prioridade que deveria ter. Não temos um programa de reforma agrária estadual, não temos um programa de habitação.
Então, é um excelente governador para os interesses que ele defende. E temos uma relação de respeito mútuo, faço oposição crítica, sistemática, mas é com respeito.
MidiaNews – Ultrapassamos a metade do ano, quais são os projetos que o senhor está focando no momento?
Lúdio Cabral – Nós renovamos o nosso mandato com mais que o dobro da votação de 2018. Sai de 22.701 votos para 47.433 votos, uma avaliação muito positiva, mas que ao mesmo tempo amplia a responsabilidade que temos.
Desde o meu primeiro mandato meu dever foi sempre com a defesa dos direitos da parcela da população que precisa de serviços públicos de qualidade. Dentro desse foco tem a luta pela saúde, pela educação pública de qualidade, pelos servidores, pelo meio ambiente e um modelo que não seja de exploração econômica, mas que seja de desenvolvimento saudável, justo. E no segundo mandato a gente prossegue nesse mesmo caminho.
FONTE: Midia News