O juiz Laossy Amorim Marquezini manteve ontem a prisão do casal que estuprou e matou a venezuelana Julieta Ines Hernandez Martinez, de 38 anos, quando descansava em uma pousada no Amazonas.
O juiz converteu a prisão em flagrante em prisão preventiva em audiência de custódia. Após a detenção do casal Thiago Agles da Silva, 32, e Deliomara dos Anjos Santos, 29, o juiz decidiu que a dupla deveria permanecer na cadeia “para preservar a ordem pública”.
Um dos motivos é que o autor teria tentado fugir. “Quanto ao custodiado Thiago Agles da Silva, há informação de que ele teria tentado se evadir do local, pelo que imperiosa sua prisão para a garantia da aplicação da lei penal”, escreveu Marquezini em sua decisão.
Para o juiz, a prisão domiliciar não era necessária. “Posto que não restou demonstrado que os autuados são imprescindíveis aos cuidados especiais de seus descendentes”, escreveu.
“Homologo a prisão em flagrane de Deliomara dos Anjos Santos e Thiago Agles da Silva e a converto em prisão preventiva, o que faço para preservar a ordem pública”, escreveu o juiz Laossy Amorim Marquezini.
O casal será transferido em breve. Ainda presos na carceragem da 37ª Delegacia Interativa de Polícia de Presidente Figueiredo (AM), “eles serão encaminhados para o Presídio de Manaus assim que a juíza da comarca autorizar”, informou ao UOL o delegado Valdnei Silva.
Como foi o crime
A escalada de violência começou com o roubo de celular. A ideia teria partido de Thiago Angles da Silva, 32 anos. Ele passou os três dias anteriores fumando crack, informou o delegado Valdnei Silva, da 37ª Delegacia Interativa de Polícia de Presidente Figueiredo (AM).
O homem foi na direção de Julieta com uma faca na mão. Era cerca de 1h, na madrugada de 24 de dezembro, e a vítima dormia em uma rede esticada na área da pousada localizada em Presidente Figueiredo (AM).
Artista de circo, Julieta atravessava o Brasil de bicicleta. Saiu do Rio de Janeiro em direção a Puerto Ordaz, na Venezuela, onde sua mãe mora. No caminho, dormia onde era possível.
Na noite do crime, Thiago teria dado uma gravata e jogado a vítima no chão. Na sequência, mandou sua namorada amarrar os pés da viajante. Deliomara dos Anjos Santos, 29 anos, teria recusado a ideia de roubar o celular, mas obedeceu. O casal também ficou com a bicicleta da venezuelana.
Estupro na cozinha
Os dois moravam em uma pousada precária em Presidente Figueiredo, segundo o delegado. Ele afirmou que a dupla vivia no imóvel de favor havia sete meses e o quintal estava cercado de mato e lixo.
Mesmo assim, o estabelecimento recebe pessoas que atravessam a pé ou de bicicleta a BR 174 — a estrada liga Manaus a Boa Vista. O estabelecimento fica perto de um local para banho de rio.
Única hóspede naquela noite, Julieta foi arrastada para a cozinha e estuprada. Deliomara disse, no depoimento, que o namorado usou a faca para obrigar a artista a fazer sexo oral nele, segundo a polícia.
Thiago falou que a companheira ficou com ciúmes. Segundo o delegado, existem pontos divergentes nas declarações de ambos, mas os dois confirmam o estupro e a forma violenta como a situação foi interrompida.
Deliomara ateia fogo em Julieta e Thiago
Fora de si, Deliomara atirou álcool na artista e no namorado e ateou fogo. A agressora permaneceu na cozinha. Thiago socorreu Julieta, relatou o delegado. Ele apagou as chamas com um pedaço de tecido encharcado.
A ajuda foi passageira, e Thiago aplicou outra gravata na venezuelana. A interrupção na respiração foi tão longa que a artista desmaiou.
O homem saiu para buscar ajuda no hospital de Presidente Figueiredo, contou o delegado. Ele teve o tronco e a cabeça queimados. Deliomara ficou em casa com a venezuelana desacordada no chão da cozinha.
Hora da morte indeterminada
A artista foi arrastada por cerca de 15 metros e enterrada por Deliomara. O delegado explicou que o corpo foi depositado numa cova rasa. Um amontoado de lixo foi colocado para esconder a terra remexida.
O cadáver estava com as mãos e pés amarrados quando foi desenterrado. O estado avançado de decomposição não permitiu identificar se havia sinais de queimadura. O delegado acrescenta que aguarda a perícia para saber o momento da morte. Existe a possibilidade de Julieta ter morrido na segunda gravata de Thiago.
O óbito também pode ter ocorrido porque a venezuelana foi enterrada viva. Não há garantia de que os exames conseguirão determinar quando a artista morreu.
Thiago não participou da ocultação
Thiago estava no hospital no momento em que a venezuelana foi enterrada. As queimaduras inspiravam cuidados e ele foi removido para Manaus, declarou o delegado. Ficou alguns dias internado (passou o Natal hospitalizado) até receber alta.
Depois ele voltou para a pousada e foi aceito pela namorada. Ambos continuaram a dividir o mesmo teto. O casal tem cinco filhos pequenos. Todos foram entregues aos cuidados dos avós depois da prisão dos pais.
Como foi a investigação
Sem notícias de Julieta desde 23 de dezembro, amigos e familiares ficaram preocupados. A polícia foi acionada, e fotos dela passaram a ser publicadas na imprensa local e nacional.
Investigadores visitaram as pousadas da cidade. Estiveram no local onde vive o casal, mas a única informação obtida era de que ela passou por lá no dia 23 de dezembro.
Também foi descoberto que Julieta tentou ficar em outros estabelecimentos. Como todos estavam lotados, só restou a pousada onde vivia o casal. Nem cama havia, e ela dormia numa rede na varanda.
A informação crucial para desvendar o caso surgiu na sexta-feira. Um homem passava pelo local, na volta do trabalho, e desconfiou que o quadro da bicicleta jogado no meio do mato era parecido com o que vira nos jornais sendo da venezuelana.
O trabalhador avisou a Guarda Municipal, e a denúncia chegou ao delegado Valdnei Silva. Ele pediu para os agentes impedirem a saída do casal e foi para a pousada acompanhado de uma equipe de investigação.
Prisão em flagrante
Questionado sobre a situação, o casal caiu em contradição e confessou o crime. Os dois levaram os policiais ao ponto onde Julieta estava enterrada. Também mostraram que havia mais objetos dela perto do quadro da bicicleta.
Valdnei disse que o inquérito também apura estupro e homicídio duplamente qualificado por meio cruel e motivo torpe. Ele aguarda os laudos das perícias no corpo e numa faca para concluir a investigação.
Thiago declarou à polícia que já cumpriu pena por tráfico de drogas. Na ocasião, ele morava em Roraima. Deliomara negou que seja usuária de drogas.
Outro lado. O UOL tentou falar com a defesa dos suspeitos, mas até o momento eles não têm advogado, conforme consta nos autos.
FONTE: Folha Max