Especialistas em vacinação e no cuidado de crianças e adolescentes apontam que avanços recentes na cobertura vacinal são resultado de ações do governo, sociedades médicas e de pais e responsáveis. E garantem que o maior grau de imunização tem o efeito imediato de salvar vidas e evitar doenças graves.
Pesquisa do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgada nesta segunda-feira (15) revelou que diminuiu o número de crianças não vacinadas no Brasil. Os números tiram o Brasil da lista dos 20 países com mais crianças não imunizadas.
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, atribuiu a melhoria brasileira na vacinação ao Movimento Nacional pela Vacinação, lançado pelo governo em fevereiro de 2023, primeiro ano do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Ao comentar o resultado do estudo global, Nísia disse que 2023 marcou uma inflexão no comportamento da cobertura vacinal do país.
“Desde 2016, o Brasil enfrentava quedas crescentes nas coberturas vacinais de vários imunizantes do calendário infantil. Depois de conquistas tão importantes como a erradicação da varíola e a eliminação da circulação do vírus de poliomielite, o Programa Nacional de Imunizações encontrou forte risco”, assinalou.
“Mas conseguimos reverter esse cenário”, comemorou a ministra. “O movimento pela vacinação venceu com a volta da ciência e da confiança da população brasileira nas vacinas do SUS [Sistema Único de Saúde]”, afirmou.
A ministra disse que recebeu com “alegria e esperança” a notícia do aumento da cobertura vacinal de 13 das 16 principais vacinas do calendário infantil. Nísia destacou ainda o empenho das “famílias que levaram as crianças para atualizar a caderneta de vacinação”.
Entre os destaques de crescimento estão as vacinas contra a poliomielite (VIP e VOP), pentavalente, rotavírus, hepatite A, febre amarela, meningocócica C (1ª dose e reforço), pneumocócica 10 (1ª dose e reforço), tríplice viral (1ª e 2ª doses) e reforço da tríplice bacteriana (DTP).
Nos 13 imunizantes que apresentaram recuperação, a média de alta foi de 7,1 pontos percentuais.
Efeito imediato
A diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), Flávia Bravo, explicou à Agência Brasil que a reversão da queda na cobertura vacinal tem um efeito imediato e direto. “Aumentar a chance de melhorias de saúde, evitar doenças infecciosas preveníveis. Proteção é salvar vidas, evitar doenças graves”.
A integrante do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) Melissa Palmieri destacou que a maior proporção de vacinados se reflete também na maior proteção das crianças que, por algum motivo de saúde, não podem tomar determinadas vacinas.
“Esse aumento da cobertura vacinal também impacta naquelas – que é um percentual muito pequeno – que por algum motivo médico não podem ser vacinadas para algumas doenças. Isso faz com que a alta cobertura diminua a circulação desses agentes infecciosos e haja uma proteção indireta para aquelas crianças que não puderam se vacinar”, explicou à Agência Brasil.
Confiança
Flávia Bravo, da Sbim, aponta três agentes responsáveis pelos números positivos de 2023, o Ministério da Saúde, as sociedades médicas e as famílias, que, destaca, recuperaram a confiança nas vacinas mesmo estando expostas a notícias falsas e comentários não verdadeiros sobre riscos e efeitos adversos dos imunizantes.
A diretora da Sbim entende que um dos motivos que fizeram com que a cobertura vacinal tivesse caído nos anos anteriores a 2023 foi a junção de notícias falsas e um desconhecimento da gravidade das doenças.
“É muito complicado para a população lembrar do impacto dessas doenças que a gente tinha controlado exatamente com a vacinação. Você não tem o medo da doença, você tem um desconhecimento, não sabe sequer o que essas doenças são”, disse.
Essa “falta de medo da doença” se associava, segundo ela, “ao medo da vacina, a ver os eventos adversos falsos e a risco propagados que não são verdadeiros”.
Melissa Palmieri, da SBP, também reconhece os efeitos negativos da circulação de informações falsas. Ela recomenda que país e responsáveis busquem informações confiáveis sobre a importância dos imunizantes.
“Eles devem se informar com pediatras, que estão atualizados com as recomendações do Programa Nacional de Imunizações e da SBP, bem como agências ou instituições idôneas, as secretarias municipais e estaduais de Saúde e o Ministério da Saúde, que vem trabalhando para disseminação de informações importantes para que os pais tenham a melhor decisão em vacinar”, orienta.
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, destacou o papel do personagem Zé Gotinha. “O Zé Gotinha viajou pelo Brasil levando a mensagem de que vacinas salvam vidas”.
O Ministério da Saúde e Flávia Bravo, da Sbim, apontam que uma das estratégias adotadas em 2023 e que permitiram a expansão da vacinação pelos mais diversos cantos do país foi o microplanejamento, método recomendado pela OMS que leva em conta as diferentes características das cidades. Consistem em atividades com foco na realidade local, desde a definição da população alvo, escolha das vacinas, definição de datas e locais de vacinação, até a logística.
“Quem executa as ações de imunização, no fim das contas são os municípios”, esclarece Flávia Bravo. Ela exemplifica regiões em que a grande parte dos pais e responsáveis trabalham no horário comercial, e a campanha de vacinação precisa ser realizada em horário diferenciado.
De acordo com o Ministério da Saúde, R$ 150 milhões foram repassados em 2023 aos estados e municípios, em apoio às ações de imunização, com foco no microplanejamento, ou seja, nas ações de comunicação regionalizadas. Para este ano, está sendo destinado o mesmo valor.
Programa
A diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações disse que o avanço do Brasil no cenário global é também um recado para o mundo. “É uma comprovação que o programa nacional sabe trabalhar, tem vontade e, tendo condições e apoio, a gente recupera aquilo que a gente sempre soube fazer e voltar a ser uma história de sucesso”, afirmou, se referindo ao protagonismo do Brasil na imunização da população.
Flávia Bravo enfatizou ainda que as imunizações para cada doença devem ser todas tratadas como prioridades. “Qualquer uma delas, se você não atinge a meta cobertura, que para algumas vacinas é 80%, para outras é 95%, você vai acumulando suscetíveis”, disse.
“Basta um caso para virar um surto, um aumento no número de casos de doenças que são preveníveis, então não existe um calcanhar de Aquiles”, alerta.
Ela cita algumas doenças que podem voltar ao cenário epidemiológico, caso haja baixa da cobertura de imunização. “A poliomielite tem o vírus derivado do vírus vacinal circulante e fazendo surtos ao redor do mundo, que pode chegar ao Brasil e encontrar suscetíveis. O sarampo e a coqueluche são a mesma coisa”, assinala.
A especialista lembra que, recentemente, o Ministério da Saúde emitiu uma nota de alerta para a coqueluche em território brasileiro.
Melissa Palmieri, do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria, lembra que, assim como o governo, pais e responsáveis têm a obrigação de atuar para garantir a segurança das crianças.
“Além da garantia em legislação pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, os pais devem assegurar de oferecer todas as ferramentas para manutenção de saúde de seus filhos, prevenção e manutenção”, afirma.
“Agência Brasil”