A Polícia Civil de Goiás concluiu o inquérito policial e indiciou o homem que engravidou uma menina de 13 anos por suspeita de estupro de vulnerável. A menina havia manifestado desejo pela interrupção da gestação quando estava na 18ª semana.
O procedimento, porém, foi negado pelo TJ-GO (Tribunal de Justiça de Goiás), após pedido do pai dela, apesar de a lei brasileira autorizar aborto em caso de estupro —todo ato libidinoso envolvendo menores de 14 anos é considerado estupro de vulnerável.
Nesta quinta-feira (25), quando a gravidez já se aproxima da 30ª semana, o STJ (Supremo Tribunal de Justiça) liberou o procedimento, segundo noticiou a coluna da Mônica Bergamo.
Na investigação conduzida pela polícia, foram colhidos depoimentos da vítima, testemunhas, interrogatório do investigado e laudo de exame de corpo de delito de prática sexual delituosa.
O homem declarou que não sabia a idade da adolescente, mas a Polícia Civil considerou que tal afirmação não é suficiente para isentá-lo.
Os investigadores destacam a gravidade do contexto de sexualização da adolescente e a prática de relações sexuais sem o uso de preservativo, o que resultou na gravidez da vítima.
A Polícia Civil também lembra que, de acordo com o Código Penal e a jurisprudência dos Tribunais Superiores, em crimes sexuais contra menores de 14 anos o consentimento da vítima ou a existência de relacionamento amoroso com o autor não excluem a ocorrência do crime de estupro de vulnerável.
Gabriela Moura, delegada à frente do caso, explica que o Código Penal estabelece uma presunção legal absoluta de violência, por considerar que um adolescente menor de 14 anos não tem maturidade necessária para se autodeterminar sexualmente.
Aborto legal no Brasil
Nesses casos, diz ela, a Polícia Civil conduz a investigação de forma “menos gravosa possível à vítima, evita sua revitimização e exposição de sua intimidade”. “A escuta de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual segue critérios legais específicos, evitando o agravamento de traumas e prejuízos à sua saúde emocional.”
Para Laura Molinari, coordenadora da campanha Nem Presa Nem Morta, a autorização da interrupção da gravidez é importante para reforçar a decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes, em maio deste ano.
Na decisão, Moraes suspendeu uma resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) que proíbia a utilização de uma técnica clínica (assistolia fetal) para a interrupção de gestações acima de 22 semanas decorrentes de estupro.
A assistolia fetal foi recomendada pela presidente do STJ Maria Thereza de Assis Moura. Na decisão, a ministra diz que o procedimento é recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para gestações tardias.
“Nos últimos anos, foram várias decisões a nível da justiça estadual, que proíbiram o aborto tardio, inclusive de crianças”, diz Molinari, que reforça que a decisão do STJ também propõe uma solução para situações em que a vítima manifesta o desejo pelo aborto legal, mas os genitores tentam impedir. “A Justiça precisa agir para garantir direitos”, afirma Molinari.
Socióloga e ativista da organização Católicas pelo Direito de Decidir, Tabata Tesser considera que, com a decisão, a ministra prezou pela “justiça reprodutiva”.
“A decisão não deve ser motivo de comemoração, uma vez que a adolescente passou por muitos obstáculos e a autorização do procedimento acontece tardiamente”, diz ela, que considera que a adolescente deveria ter tido acesso ao procedimento desde a primeira vez que manifestou o desejo pela interrupção.
“Em vários momentos, ela disse que queria acabar com o pesadelo. O que a ministra faz hoje é acabar com esse pesadelo”, afirma Tesser.
Na quarta-feira (24), o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania oficiou os órgãos que integram o SGDCA (Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente) sobre o caso.
No documento, a pasta solicitou informações sobre as providências até então adotadas para proteger e garantir os direitos da adolescente, conforme o previsto pelo ECA (Estatuto da Criança e Adolescente) e pelo Código Penal Brasileiro.
Em nota, o ministério afirma que oficiou o Tribunal de Justiça de Goiás, o Ministério Público do Estado, a Defensoria Pública de Goiás, o Juizado da Infância e Juventude de Goiânia, o Conselho Tutelar da Região de Campinas (GO), a Casa dos Conselhos localizada em Goiânia e o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente.
A pasta reitera que a legislação brasileira prevê que casos como o da menina de 13 anos, que teve uma gravidez fruto da relação com um homem de 24 anos, são tipificados como estupro de vulnerável. Ainda segundo o ministério, “o aborto nas situações de gravidez resultante de estupro está previsto no artigo 128, II, do Código Penal Brasileiro, sem qualquer vedação ou condicionante à idade gestacional”.
FONTE: Folha Max