Rodinei Crescêncio
Em pleno século XXI, quando as nações deveriam estar unidas em torno de desafios globais como as mudanças climáticas e a segurança energética, o revivalismo expansionista ressurge como um espectro do passado. As recentes declarações de Donald Trump sobre a possível aquisição da Groenlândia trouxeram à tona não apenas questões de soberania, mas também o crescente interesse estratégico no Ártico, uma região antes ignorada e agora cobiçada pelas potências globais.
O expansionismo, movimento histórico que marcou épocas como o imperialismo europeu e a doutrina do “Destino Manifesto” nos Estados Unidos, parecia ter se tornado uma reliquia do passado. Contudo, Trump, conhecido por sua retórica nacionalista e populista, reacendeu essa narrativa. Sob o pretexto de fortalecer a economia e a segurança dos EUA, sua declaração sobre a compra ou anexação da Groenlândia é um exemplo contemporâneo de como o expansionismo ainda ecoa nas políticas internacionais.
Por que, então, a Groenlândia é tão atraente? O interesse é menos sobre o território em si e mais sobre o que ele representa. A ilha é rica em recursos naturais, como minerais críticos e petróleo, e sua localização estratégica no Ártico oferece uma posição privilegiada em uma região onde a influência geopolítica é cada vez mais disputada. Com o derretimento das calotas polares, novas rotas comerciais estão surgindo, tornando o Ártico um dos principais focos da diplomacia global.
“A retórica de Trump sobre a Groenlândia é apenas um lembrete de que, mesmo em tempos modernos, as ambições territoriais ainda são capazes de reacender velhas rivalidades e moldar novas alianças”
Mauricio Munhoz
O revivalismo expansionista não é exclusividade dos EUA. A China tem investido em infraestrutura e pesquisa na região, enquanto a Rússia expande sua presença militar no Ártico. A dinâmica que emerge não é apenas uma questão de soberania territorial, mas também uma luta por recursos e poder em um mundo onde as fronteiras do desenvolvimento econômico e tecnológico continuam a se deslocar para regiões inóspitas.
Apesar das justificativas econômicas e estratégicas, a ideia de anexar territórios em nome do progresso gera uma série de dilemas. Primeiramente, como equilibrar a exploração de recursos com a conservação ambiental? O Ártico, além de ser um repositório de riquezas, é também um ecossistema sensível, cujo desequilíbrio pode ter repercussões globais. Em segundo lugar, como garantir que a soberania de povos indígenas e de pequenos estados, como a Groenlândia (um território autônomo da Dinamarca), seja respeitada em meio a interesses de grandes potências?
A relação entre o expansionismo e a exploração do Ártico também destaca um paradoxo. O derretimento das geleiras é, em grande parte, resultado das emissões de gases de efeito estufa. Ainda assim, é essa crise climática que está permitindo o acesso aos recursos da região. Em outras palavras, o progresso industrial que causou o aquecimento global agora alimenta o próprio sistema que o agravou.
A história está repleta de exemplos de territórios que se tornaram alvos de disputa e exploração. O Ártico, com sua vasta extensão e potencial econômico, parece destinado a ser o próximo capítulo dessa narrativa. No entanto, a questão que permanece é: até que ponto os interesses nacionais podem ser perseguidos sem comprometer a cooperação global e o equilíbrio do planeta?
A retórica de Trump sobre a Groenlândia é apenas um lembrete de que, mesmo em tempos modernos, as ambições territoriais ainda são capazes de reacender velhas rivalidades e moldar novas alianças. O desafio é encontrar um caminho que priorize o diálogo e o consenso, garantindo que o Ártico não se torne apenas mais um palco para disputas que ignoram as consequências de longo prazo.
Ao contemplarmos o futuro, é importante perguntar: estamos prontos para superar o legado expansionista e tratar o planeta como uma casa comum, ou continuaremos a repetir os erros do passado? Esse é o verdadeiro desafio que o Ártico nos impõe.
Escrito com Sara Nadur Ribeiro.
Mauricio Munhoz Ferraz, é assessor do presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso, professor de economia. Foi secretário de Estado de ciência e tecnologia e adjunto de infraestrutura do governador Mauro Mendes, superintendente do Ministério da Agricultura em Mato Grosso e diretor do Instituto de pesquisas da Fecomercio. Mestre em sociologia rural, seu livro “o avanço do agronegócio” faz parte do acervo da Universidade Harvard, e seu livro “A lei kandir” na biblioteca do congresso, ambos nos Estados Unidos. Seu livro “Rota de Fuga, a história não contada da SS” esteve entre os 10 mais vendidos na Amazon e foi traduzido para o inglês, pela editora Chiado, de Portugal. Foi vencedor do prêmios internacional “empreedorismo consciente” do Banco da Amazônia e do nacional “Celso Furtado” do governo brasileiro.
FONTE: RDNEWS