Rodinei Crescêncio
Na madrugada do dia 21 de junho, a brasileira Juliana Marins, de 33 anos, iniciou uma trilha ao Monte Rinjani, um vulcão ativo na ilha de Lombok, na Indonésia. O que era para ser uma experiência transformadora terminou de forma trágica. Juliana caiu em uma fenda profunda e ficou ferida em uma área de difícil acesso. Seu corpo só foi resgatado cinco dias depois, sem vida. O caso gerou comoção nacional e internacional, não apenas pela brutalidade da morte, mas pelo conjunto de circunstâncias que a cercaram: denúncias de negligência, demora no resgate e falhas na condução do passeio.
“A ética da responsabilidade nos impõe uma pergunta desconfortável: é justo que o ônus inteiro recaia sobre um único elo da cadeia, ou precisamos ampliar o campo de visão e repensar todo o sistema que permite, ou negligencia, esse tipo de risco?”
Segundo relatos, o guia responsável pela trilha abandonou Juliana após a queda. Amigos e outros turistas denunciaram a lentidão e desorganização das equipes de resgate. A família afirma que Juliana permaneceu viva por horas, talvez dias, e que, com uma ação mais rápida e eficaz, sua vida poderia ter sido salva. Esse episódio doloroso nos obriga a olhar além do drama individual e lançar luz sobre questões mais amplas de responsabilidade coletiva e justiça.
Vivemos em uma época em que experiências extremas, como escalar montanhas ou explorar vulcões ativos, são vendidas como “viagens da alma”, ritos de passagem para quem busca autoconhecimento. Mas essas experiências, muitas vezes, dependem de uma cadeia de cuidados que envolve profissionais, agências de turismo, órgãos públicos e governos locais. Quando essa cadeia falha, como no caso de Juliana, quem deve ser responsabilizado?
O primeiro impulso costuma ser culpar o indivíduo mais próximo do evento, no caso, o guia que abandonou a vítima. Mas essa resposta é insuficiente. Ela ignora um possível contexto mais profundo: a falta de regulação adequada, o despreparo de alguns profissionais, a ausência de protocolos claros e eficazes. A ética da responsabilidade nos impõe uma pergunta desconfortável: é justo que o ônus inteiro recaia sobre um único elo da cadeia, ou precisamos ampliar o campo de visão e repensar todo o sistema que permite, ou negligencia, esse tipo de risco?
Por isso, o caso de Juliana também convoca uma reflexão sobre o significado de justiça. Após sua morte, surgiram manifestações nas redes sociais com a hashtag #JusticeForJuliana. Mas que justiça é essa que buscamos? Justiça legal, com punição aos responsáveis diretos? Justiça institucional, com reformas e medidas para que o ocorrido não se repita? Ou uma justiça simbólica, em que a memória de Juliana sirva como alerta e mobilização?
Diante de tragédias como essa, há sempre o risco de que a comoção se dilua com o tempo. Mas o verdadeiro compromisso com a justiça é aquele que transforma luto em ação, dor em consciência. Que o caso de Juliana Marins não seja apenas mais um entre tantos, mas um marco para repensarmos nossa responsabilidade frente à vida, sobretudo quando ela está, literalmente, à beira do abismo.
Escrito com Sara Nadur Ribeiro
Maurício Munhoz Ferraz é assessor do presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso e professor de economia
FONTE: RDNEWS