Moraes pode acionar foro internacional contra Lei Magnitsky, mas eficácia é improvável

O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), pode acionar cortes e comissões internacionais para contestar a sanção contra ele feita pelos Estados Unidos via Lei Magnitsky.

 

A medida, entretanto, teria andamento lento e, mesmo com resolução positiva para o magistrado, seria pouco eficaz, na avaliação de especialistas ouvidos pela reportagem.

 

Eles comentam mais duas vias possíveis de contestação para o juiz: a diplomática e a de acionamento do Judiciário americano, cada uma delas também com empecilhos que podem dificultar uma decisão favorável ao magistrado.

 

Moraes foi alvo da Lei Magnitsky no dia 30 de julho. O Governo dos EUA alegou que o juiz age contra a liberdade de expressão e persegue Jair Bolsonaro (PL) e aliados.

 

O ex-presidente é réu em uma ação penal que investiga a tentativa de golpe de 2022. Com a possibilidade cada vez mais próxima de uma condenação, aliados do ex-mandatário -a exemplo de um de seus filhos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP)- intensificaram ataques a Moraes, que é relator no processo.

 

A Lei Magnitsky prevê sanções econômicas a graves violadores de direitos humanos ou acusados de corrupção. A aplicação contra o magistrado gerou contestação de especialistas como William Browder, incentivador global da lei, sobre possível inadequação.

 

Raphael Rocha, professor de direito da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora) e doutor em direito internacional pela Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), vislumbra duas possibilidades de contestação da lei no sistema judiciário internacional.

 

A primeira delas é via Sistema Interamericano de Direitos Humanos, composto por uma comissão e uma corte. A Corte Interamericana tem poder de julgamento, mas não poderia ser acionada pelo Brasil porque os EUA não reconhecem a sua jurisdição.

 

Restaria, portanto, a via da comissão, mas uma decisão dela tem efeito apenas simbólico, afirma Rocha. Além disso, um resultado viria, provavelmente, depois de anos.

 

Um outro empecilho no acionamento da comissão é o fato de que ela exige o esgotamento das instâncias internas -neste cenário, o judiciário dos Estados Unidos-, antes do aceite do caso, aponta o especialista.

 

O outro cenário internacional vislumbrado por Rocha é o de acionamento da CIJ (Corte Internacional de Justiça), principal órgão judicial da ONU (Organização das Nações Unidas).

 

Aqui, o Brasil poderia entrar com uma ação alegando que os Estados Unidos tentam violar princípios do direito internacional e a soberania do país ao aplicar a Magnitsky em Moraes, uma vez que o magistrado foi sancionado por sua atuação no STF.

 

O resultado geraria uma decisão vinculante, mas resposta favorável provavelmente seria barrada pelo governo americano, que tem poder de veto na ONU. Por isso, essa decisão também seria, na prática, simbólica, além de lenta.

 

No dia 4 de agosto, o CNDH (Conselho Nacional dos Direitos Humanos) protocolou uma denúncia na ONU sobre as sanções. Segundo Rocha, eventual decisão favorável ao ministro também teria efeito apenas simbólico e baixa eficácia.

 

Ademais da via internacional, uma contestação da Magnitsky poderia se dar via diplomacia ou pelo judiciário estadunidense, este último a sugestão do incentivador global da lei William Browder.

 

Essa via pode ser a mais promissora, na interpretação de Fabio Andrade, cientista político e professor do curso de Relações Internacionais da ESPM. A proposta já foi debatida pelo governo Lula (PT).

 

Andrade diz que é possível a contratação de um escritório jurídico no país para apresentar à Justiça o argumento de má utilização da lei. O problema nisso seria o fato de a Suprema Corte daquele país ter tendência conservadora.

 

“Pode acontecer de Moraes ganhar em instâncias mais baixas e ter sua decisão revisada na Suprema Corte”, explica Andrade.

 

A aposta também seria “arriscada” e “custosa”, na interpretação do especialista. “Esse é um caminho que também envolve riscos, mas seria mais efetivo do que procurar a Comissão Interamericana”.

 

Outra via possível é a diplomática, também com seus percalços. Segundo Andrade, não só o Itamaraty, mas toda a diplomacia tradicional tem tido muita dificuldade para reverter decisões da Casa Branca.

 

Ainda assim, essa é uma via possível, interpreta Elaini Silva, doutora em direito internacional pela USP e professora da PUC-SP.

Silva afirma, entretanto, que o imbróglio com a sanção a Moraes vem de problema anterior sobre a legitimidade geral da lei, que tem sido aplicada a depender do gosto dos Estados Unidos.

 

“A lei em si é problemática. Porque não cabe aos Estados Unidos ser o juiz do mundo. Os Estados Unidos não fazem parte dos sistemas de proteção aos direitos humanos e aí adotam medidas internas, unilaterais, que aplicam como querem. Na medida em que adotam esse tipo de ação, é óbvio que vai abrir espaço para mau uso. É para isso que foi feita [a Lei Magnitsky].”

FONTE: MIDIA NEWS

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