'É um alívio, mas queremos e precisamos de respostas', diz família de Tenório Jr. após identificação


Argentina identifica restos de pianista brasileiro Tenório Jr.
A família do pianista brasileiro Francisco Tenório Cerqueira Júnior, identificado oficialmente neste sábado (13), quase 50 anos após seu desaparecimento em Buenos Aires, afirmou neste domingo (14) que recebeu a confirmação da morte do músico com “um misto de alívio e tristeza”.
A confirmação veio por meio de exames de impressões digitais realizados com apoio da Justiça argentina e da Embaixada do Brasil.
“É um alívio porque, finalmente, podemos saber com mais segurança o que aconteceu com ele naquele triste março de 1976. De alguma maneira, estaremos mais próximos. Tristeza pela confirmação de que Tenório foi vítima da violência e enterrado como um desconhecido, longe da família, dos amigos, dos parceiros de música”, diz o comunicado assinado pelos filhos Elisa, Andrea, Francisco e Margarida.
Tenório Jr. era pai de cinco filhos — o mais novo nasceu um mês após seu desaparecimento. A família relata que, por anos, alimentou a esperança de que ele voltasse.
“Com o tempo compreendemos que não teríamos mais respostas. Que teríamos que conviver sem saber o que aconteceu de fato. É um choque saber que ele estava lá o tempo todo.”
A nota também presta homenagem à mãe, Carmen, que criou os filhos sozinha e chegou a ir à Argentina para prestar depoimentos às autoridades.
Agora, os filhos pedem uma nova investigação sobre o caso:
“Ainda queremos e precisamos de respostas. Quem matou Tenório? Por quê? Por que matar um homem sem nenhum envolvimento político, que só vivia para a música?”
Tenório Jr. desapareceu em março de 1976, às vésperas do golpe militar argentino, em um contexto de repressão coordenada pelas ditaduras sul-americanas, conhecido como Operação Condor.
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Saiba quem foi Tenório Jr.
Considerado um dos grandes nomes da música instrumental brasileira da época, Tenório Jr. foi referência no samba-jazz e na bossa nova.
Corpo de pianista brasileiro Francisco Tenorio Cerqueira Júnior morto pela ditadura argentina é identificado
Reprodução
Com carreira marcada por parcerias com Vinicius de Moraes, Toquinho e Leny Andrade, Tenório deixou sua marca em álbuns antológicos e festivais nacionais e internacionais.
Seu desaparecimento, ocorrido durante uma turnê pela América do Sul, só ganhou repercussão anos depois, devido à censura imposta pelas ditaduras da época.
Trajetória
Francisco Tenório Cerqueira Júnior nasceu em 4 de julho de 1940, no bairro das Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Ele começou sua formação musical aos 15 anos, estudando acordeão e violão, até se dedicar ao piano — instrumento que o consagraria como um dos maiores nomes do samba-jazz.
Na década de 1970, tornou-se figura central no Beco das Garrafas, reduto da bossa nova em Copacabana, na Zona Sul. Seu estilo refinado e domínio técnico o tornaram referência na fusão entre jazz e música brasileira.
Ao longo da carreira, Tenório Jr. colaborou com grandes nomes da música brasileira, como Vinicius de Moraes, Toquinho, Wanda Sá, Leny Andrade e Edson Machado, entre outros.
Toquinho fala sobre desaparecimento de Tenorio Jr
Sua atuação como músico de apoio em shows e gravações contribuiu para consolidar o estilo sofisticado da bossa nova e do samba-jazz.
Tenório Jr. participou de festivais e gravações históricas, deixando sua marca em álbuns antológicos, como:
É Samba Novo, de Edson Machado;
Arte Maior, de Leny Andrade (com o Tenório Jr. Trio);
Desenhos, de Victor Assis Brasil;
O Lp, de Os Cobras;
e Vagamente, de Wanda Sá.
Além das importantes participações citadas, Tenório Jr. gravou seu único disco solo, o LP instrumental “Embalo” (1964), considerado um marco no samba-jazz, no qual também foi pianista e arranjador.
Em março de 1976, Tenório Jr. embarcou em uma turnê pela Argentina e Uruguai ao lado de Vinicius de Moraes, Toquinho, Mutinho e Azeitona. O grupo se apresentou em Buenos Aires, Punta del Este e Montevidéu.
Após um show no Teatro Gran Rex, o pianista saiu do hotel Normandie, onde estava hospedado e nunca mais voltou.
Desaparecimento
Segundo investigações, Tenório Jr. foi confundido com um militante político e detido por agentes do serviço secreto da Marinha argentina.
Ele teria sido levado para a Escola de Mecânica da Armada (ESMA), centro clandestino de detenção e tortura, onde foi mantido por nove dias antes de ser executado.
Seu corpo foi encontrado em 20 de março de 1976 em um terreno baldio próximo a Buenos Aires e enterrado como indigente no Cemitério de Benavídez. Na época, o desaparecimento teve pouca repercussão no Brasil, devido à censura imposta pela ditadura militar.
Identificação
A confirmação da identidade de Tenório Jr. só veio em 2025, após quase cinco décadas de buscas.
A Equipe Argentina de Antropologia Forense realizou exames de RH digital e impressões digitais que permitiram identificar os restos mortais. A Embaixada do Brasil agradeceu às autoridades argentinas pelos esforços na busca por memória, verdade e justiça.
A morte de Tenório Jr. se tornou símbolo da violência das ditaduras latino-americanas contra civis inocentes.
Ele deixou esposa e cinco filhos, incluindo um bebê de três meses à época do desaparecimento. Seu legado musical permanece vivo entre músicos e admiradores da música instrumental brasileira.

FONTE: Lapada Lapada

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