Ela nasceu em Maceió, em 17 de julho de 1925, e fez a passagem no dia 03 de novembro de 2025. Clara está entre uma das primeiras brasileiras a ter os direitos políticos cassados pela ditadura militar em 1964.
Clara Charf, é militante histórica dos direitos humanos das mulheres, da dignidade e da democracia
Muitas mulheres trilharam e pavimentaram o caminho do feminismo como pauta cotidiana, sendo essencial que estejam na memória. Clara Charf, é militante histórica dos direitos humanos das mulheres, da dignidade e da democracia.
Tive o imenso prazer em conhecer pessoalmente a amável Clara Charf, por intermédio da amiga Madalena Rodrigues. Participei, orgulhosamente, junto à Clara do projeto por ela liderado, através da ONG Mulheres pela Paz, que visa promover a visibilidade de mulheres que trabalham pela justiça e igualdade em todo o mundo.
A militante foi esposa do político e guerrilheiro Carlos Marighella. Todavia, nunca aceitou apenas esse “papel” de “a esposa do revolucionário”. Na verdade, ela construiu uma trajetória própria, marcada por décadas de luta política, engajamento feminista e compromisso com a justiça social. É sabido que Marighella enfrentava a ditadura com armas, e Clara com ideias.
Foram anos de exílio antes do retorno ao Brasil. Mas, Clara manteve acesa a chama da igualdade, sendo uma das fundadoras da União de Mulheres de São Paulo, organização fundamental na reconstrução da democracia e na defesa dos direitos civis e reprodutivos das mulheres brasileiras. Já em época de redemocratização, a ativista falava abertamente sobre igualdade salarial e o empoderamento político feminino. Ressalte-se que esses são temas que, até a presente data, não se encontram sedimentados.
Clara se sagrou como uma pedagoga da liberdade. Sua vida nos ensina que a luta feminista não se resume à conquista individual, mas à construção de um projeto coletivo de emancipação. Ao longo do tempo, ela demonstrou que ser feminista é resistir à domesticação do pensamento e à tentação do silêncio.
Atravessou o século XX com o olhar voltado para o novo, para o futuro. Sua trajetória é um convite à reflexão sobre os muitos apagamentos de mulheres no decorrer da história da política brasileira. Muitas mulheres foram deixadas de lado ao serem esquecidas, às vezes, em notas de rodapé ou na “coxia”. Outras tantas foram reduzidas a “esposas de” ou “filhas de”, enquanto ela fez história por mérito próprio.
As novas gerações de meninas e mulheres, que atualmente ocupam as ruas e as redes sociais, devem sentir o legado dela. O feminismo necessita ser visto como prática diária de liberdade e como força política. As diferentes militâncias nos apresentam que revolução e ternura não se excluem, mas, sim, andam juntas.
Clara não ficou relegada a ser apenas uma testemunha da história: ela a ditou e a escreveu com enorme coragem, ternura e compromisso constante com a justiça social. Viemos em um país onde as mulheres sofrem pela disfonia, já que o tema deixa de avançar como necessário. O direito de ecoar as vozes femininas vai muito além da fala, já que o excessivo desrespeito teima em as vitimizar cotidianamente, prejudicando a trilha do caminho para a igualdade.
Com um sorriso afável e largo, Clara permanecerá, por ter edificado memórias. É um daqueles nomes que trazem mais do que uma biografia, sendo adubo na produção de frutos.
Defensora incansável dos direitos humanos, não se curvou ao medo do exílio, do silêncio e da injustiça. Respondeu em sua vida terrena contra o autoritarismo, jamais deixando de lutar. Foi paciente e auxiliou na reconstrução do Brasil com o seu diálogo fraterno de amor.
Clara Charf, presente!
Rosana Leite Antunes de Barros é defensora pública estadual, mestra em Sociologia pela UFMT, doutoranda em Educação pela UFMT, membra do IHGMT, e da Academia Mato-grossense de Direito na Cadeira 29.
FONTE: MIDIA NEWS






