sábado, novembro 15, 2025

MidiaNews | O Teleférico do Alemão

e03651bcc8c1fc8fff7bd0ca61f2d2a5.jpg

O Complexo do Alemão, na zona norte do Rio de Janeiro, há muito ocupa as manchetes internacionais. Em julho de 2011, a notícia não era a de uma operação policial sangrenta, que estabeleceu um novo recorde de matança: 121, segundo a última contagem, dos quais um jovem policial civil, com apenas 63 dias de atividade na segurança pública, lotado numa pacata delegacia suburbana e sem nenhuma experiência para participar de um confronto armado daquela magnitude.

 

Foi, contudo, deslocado do seu posto para dar número ao que seria “o maior contingente de força policial no combate ao crime”. Tragicamente, integrou a estatística das mortes evitáveis na contabilidade macabra de uma política de segurança que privilegia a truculência e o espetáculo em detrimento da inteligência e da efetividade. Seu nome: Rodrigo Velloso Cabral. A ele e aos demais policiais mortos e feridos, a expressão de nosso respeito, bem como da nossa solidariedade às famílias de todas as vítimas dessa tragédia que alguns (mal-informados?) insistem em chamar de sucesso.

 

Mas, voltando a 2011. Manchetes da CNN, BBC News, El Pais e Le Monde exaltavam a inauguração do Teleférico do Alemão, como símbolo de inclusão, pacificação das favelas e urbanismo social. Um ex-governador fluminense, posteriormente condenado por corrupção contumaz confessa, chegou a declarar que se sentia ali “como nos Alpes suíços”, onde, aliás, de acordo com as sentenças condenatórias, depositava parte de suas propinas. Um dos convidados ilustres que passeou no Teleférico posando para algumas fotos foi o príncipe Harry, da Inglaterra.

 

O Teleférico do Alemão custou R$ 210 milhões em sua construção original, dispondo de 6 estações, 152 gôndolas e 3,5 km de extensão. Foi inspirado no bem-sucedido Teleférico de Medellin, na Colômbia, inaugurado em 2004 e que atualmente opera com 6 linhas, 20 estações, 309 gôndolas e 14 km de extensão, além de integração com metrô, bondes e ônibus.

 

Em novembro de 2010, poucos meses antes da inauguração do Teleférico, o Morro do Alemão foi palco de uma grande operação de segurança pública, com tropas do Exército, da Marinha e das polícias civil e militar, com o objetivo de retomar o controle territorial das comunidades e instalar Unidades de Polícia Pacificadora. Na ocasião, houve 37 mortes e as imagens aéreas da fuga de traficantes pela mata viralizaram e marcaram a cobertura jornalística. Houve uma fotografia icônica de policiais erguendo a bandeira nacional no cume do Morro do Alemão, como símbolo da “vitória definitiva contra o crime organizado”, na linguagem da época.

 

Pois bem. Após inúmeros problemas de operação e manutenção dos cabos aéreos e equipamentos, somados à falta de verbas, de planejamento e de governança, o Teleférico do Alemão foi abandonado em setembro de 2016. E, aos poucos, o controle territorial pelas forças do Estado também foi recuperado pelos criminosos. A bandeira brasileira foi retirada e não voltou.

 

Desde 2020, registraram-se pelo menos cinco grandes confrontos no Alemão (15/07/2020 – 13 mortos; 21/07/2022 – 18 mortos; 03/05/2023 – 13 mortos; 02/08/2023 – 10 mortos; e 06/02/2024 – 9 mortos). Em todos, o Estado afirmou ter vencido. Mas sempre o crime voltou.

 

Em 2024, o atual governo fluminense anunciou a recuperação do Teleférico do Alemão. Já foram contratados mais de R$ 116 milhões, grande parte em equipamentos importados, entregues, pagos e estocados em algum depósito, mas não há quaisquer obras no local, pois as seguradoras se recusam a assumir riscos. Não há previsão crível para que o Teleférico volte a funcionar.

 

Para alguns, pouco importam todos esses fatos. O banho de sangue excita os instintos e manda às favas a razão.

 

Do alto de 121 cadáveres e do esqueleto do teleférico, o governador do Rio festeja seu “sucesso” e saboreia sua popularidade.

 

Luiz Henrique Lima é professor e conselheiro independente certificado.

FONTE: MIDIA NEWS

comando

DESTAQUES

RelacionadoPostagens