Rodinei Crescêncio
Nas últimas semanas, em uma das aulas do MBA em Gestão de Cidades promovido pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), tive a oportunidade de conversar com gestores municipais sobre um tema que, aos poucos, começa a ocupar o espaço que merece no debate sobre desenvolvimento regional: a bioeconomia. Mais do que um conceito da moda, ela representa uma das chaves para transformar a maior riqueza de Mato Grosso: sua biodiversidade em prosperidade econômica e social de forma sustentável.
Sempre digo aos alunos que, quando pensamos em economia mato-grossense, nossa mente vai imediatamente para soja, milho, algodão e pecuária. E não é para menos: esses setores sustentam boa parte do PIB estadual. Mas existe um outro Mato Grosso, ainda silencioso, que pulsa nas florestas, savanas, rios e na criatividade das comunidades tradicionais. Esse Mato Grosso, se bem compreendido, pode ampliar nossas fronteiras de desenvolvimento sem ampliar a fronteira agrícola.
“A bioeconomia também fortalece outra agenda urgente: a do pertencimento territorial. Quando ribeirinhos, extrativistas, indígenas e pequenos produtores participam das cadeias produtivas, não apenas se geram empregos, gera-se cidadania”
A bioeconomia parte da ideia simples, e revolucionária, de que a natureza não é obstáculo ao progresso, mas seu principal motor. Produtos florestais não madeireiros, biocosméticos, fármacos derivados de espécies nativas, crédito de carbono, turismo ecológico, serviços ambientais, manejo sustentável de frutos e sementes do Cerrado e da Amazônia: tudo isso pode gerar renda, emprego e inclusão sem que se derrube um hectare sequer.
E essa não é uma visão romântica, é uma visão econômica. Municípios como Cotriguaçu, Juína e Alta Floresta já começam a demonstrar, em iniciativas piloto, que o manejo comunitário, a cadeia da castanha, do babaçu ou do baru pode movimentar cooperativas, gerar tributos e fortalecer a economia local. Em regiões onde a expansão agrícola já atingiu seu limite físico ou social, a saída não é expandir mais, é diversificar.
O que me faz lembrar de um exemplo que costuma causar espanto: o valor de mercado global dos biocosméticos naturais cresce, em média, 8% ao ano. Países com menos biodiversidade que o Mato Grosso já se aproveitam disso há décadas. Nós, que temos uma das maiores reservas de espécies do planeta, ainda engatinhamos. Isso não é uma crítica, é um convite. Um alerta de oportunidade.
A bioeconomia também fortalece outra agenda urgente: a do pertencimento territorial. Quando ribeirinhos, extrativistas, indígenas e pequenos produtores participam das cadeias produtivas, não apenas se geram empregos, gera-se cidadania. Municípios com baixa capacidade fiscal encontram, nesses arranjos, uma forma de ampliar arrecadação sem depender apenas do FPM ou das oscilações do agronegócio.
Mas nada disso acontecerá por gravidade. É preciso planejamento municipal, zoneamento ecológico-econômico, incentivos às cooperativas locais, laboratórios de inovação, hubs universitários, apoio tecnológico e políticas que valorizem a pesquisa aplicada à biodiversidade. Prefeitos e gestores precisam compreender que investir em bioeconomia não é despesa ambiental, é estratégia econômica.
Mato Grosso tem condições de ser o maior laboratório de bioeconomia do Brasil. Temos biomas exuberantes, gente criativa e a urgência de diversificar nossa base produtiva. A pergunta que fica é: teremos coragem de transformar essa potência silenciosa em riqueza visível?
O futuro passa pela floresta, e ele pode ser extraordinariamente próspero.
Escrito com Sara Nadur Ribeiro
Maurício Munhoz Ferraz é assessor do presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso e professor de economia
FONTE: RDNEWS
