O amor não pode ser um perigo mortal | RDNEWS

Se o amor muitas vezes machuca, não dá para mensurar a dor que o ódio é capaz de provocar. Em tempo em que predomina a aspereza, a necessidade de machucar, de diminuir e ofender, o espetáculo da grosseria, da violência está no meio das discussões, novamente e sempre. Não temos controle sobre o outro, embora acreditemos que conhecemos profundamente as pessoas com quem nos relacionamos, a quem atribuímos expectativa sobre nossa felicidade. O amor de quem te ama não está sobre seu controle. Ame-o de volta, mas concentre-se nas coisas que estão sob seu controle. Assim, se perder o amor, não perderá a identidade.

O amor de quem te ama não está sobre seu controle. Ame-o de volta, mas concentre-se nas coisas que estão sob seu controle. Assim, se perder o amor, não perderá a identidade

A raiva é uma emoção destrutiva, mas causa raiva e repulsa contar os socos, olhar para o rosto desfigurado de uma jovem mulher que foi brutalmente espancada, sabendo o namorado que a cena brutal estava sendo filmada e poderia ser usada contra ele. Logo no dia seguinte, aqui perto, tiros calaram os sonhos de uma migrante que fez sua travessia com as filhas em busca de uma vida melhor no Brasil. Mas logo aqui? O quinto país do mundo que mais mata mulheres, com arma branca, tiro, socos. O estado de Mato Grosso há dois anos é o estado brasileiro onde mais se mata mulheres. 2,5 casos por 100 mil habitantes, a maior taxa de feminicídio do país. Mato Grosso tem 2 cidades entre as dez mais matam mulheres no país, Sorriso e Tangará da Serra e os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2025, confirma ainda que os assassinos dormem ao lado.

Em geral, a violência parte de homens com vínculos afetivos com as vítimas. E o uso das câmeras de celular que poderiam aumentar o risco de o agressor ser identificado e denunciado não causa intimidação. A violência é um espetáculo que não tem freio. Numa cidade de Mato Grosso, há dias atrás, o ex-companheiro atacou a ex-mulher sob as vistas de dois outros homens que passavam pela rua e calmamente escolhiam o melhor ângulo para filmar as agressões e tentativa de assassinato.

A cantora Joelma sempre nas mídias performando alegremente, revela para a mesma mídia o inferno que viveu durante 18 anos de um relacionamento repleto de abusos físicos, psicológicos e materiais. As idas e vindas, as promessas rompidas, o ciclo se repetindo, com olhos roxos, lábio partido, ameaça de ser jogada pela janela de um hotel. Essas denúncias dão visibilidade ao tema e reforçam a urgência de discutirmos a prevenção e a conscientização sobre a violência contra a mulher.

Ocorre que as famílias não conversam sobre a violência, a escola não encaixa o tema na grade escolar, as medidas de segurança pública não conseguem antecipar medidas de proteção, sobretudo porque a violência é mascarada com cenas de arrependimento, choro, promessas e as agressões são trancadas dentro dos lares, como um segredo de família, é o que sente o corregedor nacional do Ministério Público, o procurador Ângelo Fabiano Farias da Costa, que quase solitariamente colocou o combate à violência doméstica como a prioridade absoluta de sua gestão. O dr. Ângelo tem viajado pelo Brasil, analisando de que forma o Ministério Público pode se tornar mais ágil, oferecer rede de proteção efetiva, mais conscientização das mulheres para que busquem apoio e medidas protetivas o quanto antes. 64% das vítimas de feminicídio são mortas dentro de casa.

Por mais que o tema da violência contra a mulher tenha ganhado destaque em todas as mídias, nas políticas públicas dos governos, o procurador registra que não há nenhum arrefecimento, os números e as imagens continuam assustadores.

O Senado italiano não buscou meio termo para tratar o tema, recrudesceu a pena o máximo possível e aprovou, por unanimidade, 161 votos favoráveis e nenhum contra a pena de prisão perpétua, para quem comete feminicídio. O projeto precisa ainda ser aprovado na Câmara Baixa. Há prisão perpétua no sistema jurídico italiano e a pena já foi aplicada em 2024 depois de grande mobilização e pressão diante do assassinato da jovem Giulia Cecchettin, morta pelo ex-namorado.

Olga Lustosa é socióloga e cerimonialista pública. Escreve com exclusividade para esta coluna aos domingos. E-mail: olgaborgeslustosa@gmail.com​

FONTE: RDNEWS

comando

Sair da versão mobile